Um dos mais bonitos parques naturais da Bahia é uma triste demonstração da falta de políticas públicas voltadas para o meio ambiente e o ecoturismo municipal
Boa tarde. Cumprimenta a equipe de reportagem um guarda municipal que estava de sentinela na portaria da garagem e oficina municipal, localizadas no principal acesso ao Parque Ecológico da Macaqueira, onde máquinas de grande porte e outros veículos pesados são guardados e recebem manutenção mecânica. Óleo diesel e outros poluentes são jogados irresponsavelmente em parte do leito do Rio do Ouro.
Sem que o preposto da segurança municipal esboçasse nenhuma outra atitude, e com apenas um ‘tudo bem?’, a reportagem interpreta que o caminho está liberado e segue de carro por uma apertada estrada de terra e pedregulhos. No pequeno percurso transitável, bem próximo de onde funciona a garagem que é protegida vinte e quatro horas por prepostos da segurança dos bens públicos municipal, é visto o primeiro crime ambiental, uma árvore nativa com cerca de vinte metros de altura tem seu tronco cortado em círculo para forçar a sua morte. Mais adiante, uma pedreira artesanal retira e quebra pedras de uma parte da serra. Garrafas de bebidas alcoólicas, sacolas plásticas, bitucas de cigarros e outros materiais são encontrados em todo o trecho percorrido. Sem sinal de fiscalização, a única presença encontrada foi de cinco adolescentes, duas meninas e três meninos, que passeavam pelo que deveria ser uma reserva protegida e segura, já que o local é uma Área de Proteção Permanente (APP), reconhecida pelas leis ambientais do país, por, entre outros motivos, possuir um rio permanente.
Local visitado por usuários de drogas, o cânion, formado por um vale profundo que foi cavado pelo curso da água do Rio do Ouro, ao contrário dos tempos áureos e prósperos, é tido atualmente como uma perigosa área, onde estupros e mortes são mais lembrados que suas belezas naturais.
A Macaqueira, como é mais conhecida a reserva ecológica pelos jacobinenses, além da importância natural, faz parte da história da cidade e da maioria de seus moradores. Marco de desenvolvimento, a Macaqueira é lembrada por ter abrigado os primeiros sistemas de geração de energia elétrica e água tratada para a sede do município de Jacobina. A partir do início da década de 50, do século passado, as águas do Rio do Ouro, que nasce naquela região, serviam para movimentar o gerador de uma pequena central hidrelétrica (a Casa de Luz de Jacobina), conhecida também como “usina” e para abastecer a cidade depois de passar por um processo de tratamento que acontecia em um grande tanque construído também na reserva. Local conhecido como o ‘filtro’.
Em ruínas, os locais onde funcionavam a Casa de Luz e a estação de tratamento de água, ainda despertam a curiosidades dos que conhecem a história e os que não têm ideia do que aconteceu e o que está acontecendo, caso dos pequenos Enzo Vieira Lima e José Durval, de 7 e 8 anos respectivamente. “Muito legal esse lugar”, dizia Enzo, enquanto José admirava parte do enferrujado material que sobrou da usina, “esse equipamento é massa”. Inocentes como a própria natureza, não imaginam que as gerações futuras, provavelmente seus filhos, poderão se quer conhecer as ruínas que ora conheceram. O que poderia ser um exemplo de sustentabilidade para as gerações futuras está vaticinado.
“Poucas cidades no Brasil tiveram a sorte em ser presenteada pela natureza com algo tão mágico e bonito, como a Macaqueira. É um privilégio de uma cidade possuir um local tão rico ecologicamente e próximo do centro. É um crime a não preservação e não uso consciente como um ponto turístico regional”, extasiou-se Marcelo Rocha, turista salvadorense após conhecer o parque.
O Parque Natural da Macaqueira foi criado oficialmente pelo Executivo municipal no dia 11 de setembro de 2003, em decorrência de grandes manifestações populares, pelos pedidos de moradores saudosistas que tinham o parque como área de lazer e principalmente do esforço extraordinário do falecido engenheiro agrônomo Luciano Galo, responsável pela elaboração do projeto e do plano de manejo do parque.
Para a decepção dos que sonhavam com o ecoturismo, através do resgate histórico e a preservação, a vontade se transformou novamente em apenas uma reminiscência. Depois do anúncio da revitalização da Casa de Luz, com reforma da sua estrutura física, e da construção de um moderno e conscientemente ecológico local de camping, dotado de churrasqueiras e outros componentes, o abandono e o descaso por parte do Poder Público, dos atos de vandalismo e da falta de consciência de muitos que frequentam o local prevaleceram. Os milhares de reais gastos no abrigo construído para a prática de camping, assim como o que foi gasto para a reforma da estrutura física da Casa de Luz, desceram, literalmente, rio abaixo. Do abrigo não existe praticamente nada, enquanto parte da Casa de Luz insiste em permanecer parcialmente em pé.
Atualmente o Parque da Macaqueira encontra-se em situação de total abandono, contrapondo-se à real necessidade de sua existência, que poderia ter como objetivos a realização de pesquisas científicas, o desenvolvimento de atividades de lazer, lócus de atividades de educação e de interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico, pelas contribuições microclimáticas, pelo potencial paisagístico, pelo suprimento hídrico, entre outros que possui.
O responsável pela recém-criada Secretaria do Meio Ambiente da Prefeitura de Jacobina, Ivanildo Araújo Aquino, reconhece os problemas da Macaqueira e, ao se dirimir de culpa, informa que a nova pasta já trabalha no sentido de resolver alguns problemas que ele acredita que sejam os principais entraves para o início de um trabalho de revitalização que são as questões judiciais contra proprietários de construções ilegais. “Enquanto não resolvermos o problema fundiário, das desapropriações, não poderemos avançar muito no nosso propósito, que é a revitalização e conservação do Parque da Macaqueira”, declarou Ivan Aquino. Segundo ele, já está sendo providenciado o plano de manejo do local e, com o objetivo de democratizar as ações e discussões em relação à proteção ambiental, foi criado o Conselho Municipal do Meio Ambiente e dentro desta instância, a Câmara Temática exclusiva para as áreas de conservação ambiental. O secretário informou ainda que a Garagem da Prefeitura de Jacobina será transferida e transformada na sede do Grupamento Ambiental, formado por integrantes da Guarda Municipal, que serão capacitados para combate a incêndios, legislação e fiscalização ambiental.
Por Gervásio Lima
Jacobinense e historiador
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